Os “Cortesões do infortúnio”
a heroicização pragmática de Henrique Dias nas páginas da Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro
DOI:
https://doi.org/10.22478/ufpb.2317-6725.2024v30n51.71383Palavras-chave:
História da Historiografia Brasileira, Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Negro, Henrique Dias, NecropolíticaResumo
Neste artigo pretendo analisar a produção histórica de uma personagem negra nas páginas da revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Em suas primeiras décadas, a agremiação que se colocava como principal responsável pela escrita da história “oficial” do Brasil no século XIX pouco escreveu sobre o negro na história nacional. Após muitos anos de produção dessa operação da ausência negra, em um período específico, surge a construção de um grande herói negro. O IHGB descreve um Henrique Dias – soldado negro que lutou contra as invasões holandesas no nordeste brasileiro no século XVII – desde seus interesses mais pragmáticos, em meio à Guerra do Paraguai; enquanto também reforça, com outras duas biografias - uma de um indígena e outra de um homem branco - um dos motes da operação historiográfica proposta por Karl von Martius de uma nação formada por três elementos. Porém, o Dias descrito pelos sócios dessa instituição, com fortes ligações com o Império, além de procurar convencer seu público alvo, a elite imperial, de que seria proveitoso enviar negros e negras para o Prata; produzir uma heroicização de uma personagem que, domesticando o passado, torna-se obediente à Coroa e um denodado soldado pelo Brasil que lutou até o fim por seu Rei; também contribui para a continuidade e justificação de uma necropolítica presente, pelo menos, desde o século XV luso-brasileiro, ou seja, deixar morrer e/ou enviar para morte um “outro” interno em combate contra um “outro” externo.
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